A administração pública, em qualquer nação, é o pilar fundamental para a organização, execução e fiscalização das políticas públicas que atendem aos interesses coletivos. Nesse contexto, o Direito Administrativo desempenha um papel crucial ao estabelecer normas e princípios que orientam a atuação do Estado, particularmente na gestão de recursos e serviços essenciais à sociedade.
Sob a égide do Direito Constitucional, o Direito Administrativo garante que a atuação dos agentes públicos seja pautada pelo interesse público e pela legalidade, impedindo que se sobreponham interesses privados ou individuais.
Esse alinhamento entre as normas constitucionais e administrativas assegura a imparcialidade e a equidade nas ações governamentais, refletindo os valores democráticos estabelecidos na Constituição Federal.
Neste artigo, vamos explorar a relevância do Direito Administrativo e seu vínculo com o Direito Constitucional, os princípios que regem a Administração Pública e as funções que regulam o comportamento dos servidores públicos e a relação do Estado com a sociedade.
O que é o Direito Administrativo?
O Direito Administrativo é um ramo do Direito Público que regula a atividade administrativa do Estado, abrangendo normas e princípios que visam à organização, controle e execução das funções do governo em suas diversas esferas.
Este campo jurídico estabelece os limites e as formas de atuação dos agentes públicos, das entidades públicas e das pessoas jurídicas de Direito Público, com o objetivo de proteger o interesse público.
A Função da Administração Pública
A Administração Pública pode ser entendida de duas maneiras principais: uma perspectiva subjetiva e outra objetiva. Quando nos referimos à Administração Pública em termos subjetivos, estamos falando do conjunto de órgãos e entidades que exercem a função administrativa do Estado, como ministérios, secretarias e autarquias.
Já na perspectiva objetiva, a Administração Pública é entendida como o conjunto de atividades e funções exercidas sob o regime de Direito Público, como a prestação de serviços essenciais e a fiscalização de políticas públicas.
O Direito Administrativo busca assegurar que a Administração Pública atue em conformidade com a lei, com o objetivo de atender às necessidades da coletividade.
Em suma, a função do Direito Administrativo é organizar a atuação do poder público de maneira eficiente, responsável e transparente.
A relação entre o Direito Administrativo e o Direito Constitucional
Embora o Direito Administrativo e o Direito Constitucional pertençam ao campo do Direito Público, suas finalidades e áreas de atuação são distintas, embora interdependentes.
O Direito Constitucional estabelece as normas fundamentais que orientam a Constituição de um país, incluindo os direitos e garantias individuais, a estrutura do Estado e os princípios que regem a separação de poderes. Ele define, portanto, as diretrizes para a atuação de todos os poderes, incluindo a Administração Pública.
Por outro lado, o Direito Administrativo tem como foco a organização e a fiscalização das atividades da Administração Pública, ou seja, dos órgãos e agentes públicos responsáveis pela execução das políticas públicas e serviços à população.
Ele está intrinsecamente ligado ao princípio da legalidade, que obriga os agentes públicos a atuar de acordo com o que está estabelecido em lei.
Princípio da legalidade e o interesse público
A Constituição Federal do Brasil, por meio do artigo 37, destaca a necessidade de a Administração Pública seguir os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Estes princípios garantem que a atuação do poder público esteja sempre voltada para o interesse público, e não para interesses privados ou pessoais de agentes públicos.
O princípio da legalidade determina que a Administração Pública só pode fazer o que a lei autoriza, ao contrário dos cidadãos, que podem fazer tudo o que não é proibido por ela.
Esse princípio é central tanto no Direito Administrativo quanto no Direito Constitucional, pois limita a ação dos agentes públicos e assegura que a atuação do Estado seja sempre voltada para a coletividade e dentro dos parâmetros legais.
Os princípios do Direito Administrativo
O Direito Administrativo é estruturado por diversos princípios que guiam a atuação dos administradores públicos. A Constituição Federal de 1988 aborda cinco princípios essenciais, mas a doutrina jurídica também aponta outros princípios que, embora não explicitados na Constituição, são amplamente utilizados na prática administrativa.
1. Princípio da legalidade
O princípio da legalidade é um dos pilares fundamentais do Direito Administrativo e está explicitamente previsto no artigo 37 da Constituição Federal, que determina que “a Administração Pública obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”.
Esse princípio impõe que a Administração Pública só pode realizar ações que estejam previamente autorizadas por lei. A Administração não tem liberdade para agir conforme sua vontade, mas deve sempre seguir o que está determinado na legislação vigente. A legalidade serve para garantir que a Administração Pública não atue de forma arbitrária, protegendo os direitos dos cidadãos e prevenindo abusos de poder.
Na prática, isso significa que os administradores públicos (como prefeitos, governadores, ministros e outros) não podem tomar decisões sem uma base legal para isso.
A ausência de uma norma legal que autorize determinada ação pode ser considerada ilegal, e o ato pode ser anulado. Portanto, o princípio da legalidade assegura que a atuação do Estado se limite aos poderes conferidos pelas leis e pela Constituição.
2. Princípio da impessoalidade
O princípio da impessoalidade é a garantia de que a Administração Pública deve atuar sempre em função do interesse público e não de interesses pessoais ou de grupos específicos. Esse princípio está diretamente relacionado à ideia de que a Administração não deve ser influenciada por interesses privados, sendo imparcial em suas decisões e ações.
Esse princípio visa assegurar que os atos administrativos sejam tomados com objetividade, visando o bem coletivo e não beneficiando um ou outro grupo em detrimento da população em geral. Ele também impede que os agentes públicos utilizem suas funções para fins pessoais ou partidários.
Em outras palavras, a Administração não pode agir visando a vantagem pessoal de seus membros, nem dar tratamento preferencial a um cidadão ou grupo de cidadãos em relação a outros, como ocorre em práticas de favoritismo ou nepotismo.
Por exemplo, quando um servidor público nomeia alguém para um cargo por méritos e habilidades, sem levar em conta sua relação pessoal com o nomeado, está cumprindo o princípio da impessoalidade.
3. Princípio da moralidade
O princípio da moralidade exige que os atos administrativos sejam compatíveis com os padrões éticos e morais da sociedade. Ao contrário da legalidade, que está vinculada à conformidade com a lei escrita, a moralidade exige que os atos administrativos também sejam considerados justos e adequados aos valores sociais aceitos.
Esse princípio transcende a legalidade, pois ele impõe que a Administração Pública não apenas observe a lei, mas também atue de maneira ética e responsável. O princípio da moralidade está vinculado à busca de integridade, honestidade e transparência na gestão pública.
Ele serve como um controle sobre a conduta dos administradores públicos, garantindo que suas ações não sejam apenas legais, mas também aceitáveis socialmente.
Um exemplo prático de violação desse princípio seria uma contratação de uma empresa para realizar serviços públicos, onde o processo seja marcado por corrupção ou favorecimento, mesmo que tenha sido realizado de acordo com a lei. Nesse caso, a moralidade seria violada, pois a ação é ilegítima aos olhos da sociedade.
4. Princípio da publicidade
O princípio da publicidade está relacionado à transparência e ao direito de acesso à informação. De acordo com esse princípio, todos os atos administrativos devem ser divulgados de forma ampla, permitindo que qualquer cidadão tenha acesso a informações sobre as ações e decisões do governo. O objetivo é promover o controle social e a participação cidadã na gestão pública.
Isso inclui a necessidade de que os atos administrativos sejam divulgados nos meios oficiais de comunicação, como diários oficiais, e em plataformas digitais, garantindo que a população esteja informada sobre os atos, decisões e processos da Administração Pública.
A publicidade também tem a função de prevenir a corrupção, pois ao tornar as decisões públicas e acessíveis, a Administração se vê mais pressionada a agir com honestidade e clareza.
A falta de publicidade em um ato administrativo pode gerar suspeitas de irregularidade, especialmente quando se trata de licitações, contratos ou outras ações que envolvem recursos públicos.
A ausência de transparência mina a confiança da população nas instituições públicas e pode resultar em ações judiciais ou investigações sobre o processo.
5. Princípio da eficiência
O princípio da eficiência foi introduzido pela Emenda Constitucional nº 19/98, que alterou a Constituição Brasileira, e visa melhorar a qualidade da Administração Pública, incentivando a busca por resultados eficazes e rápidos na entrega de serviços públicos.
Esse princípio implica que a Administração deve atuar com agilidade, competência, produtividade e, principalmente, com a utilização otimizada dos recursos públicos disponíveis.
A eficiência exige que os processos administrativos sejam realizados de maneira mais eficaz e com o menor custo possível para o Estado e para a sociedade. Isso significa que a Administração Pública deve buscar resultados de qualidade, de forma célere e sem desperdício de recursos.
Ele também está ligado à ideia de que o Estado deve ser capaz de oferecer serviços públicos que atendam de forma adequada às necessidades da população.
Na prática, a eficiência se manifesta em ações como a redução da burocracia, a implementação de processos digitais e a melhoria nos serviços prestados aos cidadãos. Por exemplo, a implementação de plataformas online para agendamento de serviços públicos, como emissão de documentos e consultas, torna o processo mais ágil e acessível, refletindo a busca por eficiência.
Fontes do Direito Administrativo
O Direito Administrativo não se limita à Constituição e à legislação infraconstitucional. Ele é também influenciado pela doutrina, pela jurisprudência e pelos costumes, que ajudam a interpretar e a aplicar as normas em situações específicas.
Legislação
A legislação é a fonte primária e mais formal do Direito Administrativo. Ela abrange todas as leis que regulam a atuação da Administração Pública e as relações entre o poder público e os cidadãos.
As principais leis que tratam do Direito Administrativo no Brasil estão previstas na Constituição Federal de 1988, que estabelece os princípios e as normas gerais da Administração Pública, e em diversas normas infraconstitucionais que regulamentam e detalham esses princípios.
- Lei nº 14.133/21 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos): Regula os processos de licitação e os contratos firmados pela Administração Pública. A lei estabelece procedimentos que garantem a transparência, a legalidade, a competitividade e a isonomia nas contratações públicas, visando assegurar o melhor uso dos recursos públicos. Ela também disciplina as modalidades de licitação, as condições para sua realização e as hipóteses de dispensa e inexigibilidade de licitação.
- Lei nº 8.112/90 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, Estados e Municípios): Trata dos direitos, deveres e responsabilidades dos servidores públicos, abordando temas como ingresso no serviço público, estabilidade, licenças, aposentadoria e penalidades. A Lei nº 8.112/90 também define as formas de investidura no cargo público e os procedimentos administrativos para apuração de infrações cometidas por servidores.
Além dessas, existem outras normas importantes que complementam e detalham a legislação administrativa, como a Lei nº 9.784/99 (Lei do Processo Administrativo Federal), que regula os processos administrativos no âmbito da União.
A legislação é a base jurídica mais objetiva e formal sobre a qual a Administração Pública e seus agentes devem se orientar para garantir a legalidade e a conformidade de suas ações. No entanto, por sua rigidez, muitas vezes a legislação precisa ser interpretada à luz de situações práticas, o que leva à importância de outras fontes do Direito Administrativo.
Jurisprudência
A jurisprudência refere-se às decisões proferidas pelos Tribunais, especialmente pelos tribunais superiores, como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Essas decisões têm um papel fundamental na interpretação e aplicação das normas do Direito Administrativo, já que elas oferecem um esclarecimento sobre como as leis e os princípios administrativos devem ser aplicados em situações concretas.
Embora as leis sejam fontes primárias e diretas, a jurisprudência ajuda a esclarecer e detalhar o entendimento das normas, especialmente em questões que envolvem interpretações complexas ou lacunas na legislação.
A jurisprudência também é importante quando há conflito sobre a aplicação de normas em casos específicos, uma vez que os tribunais têm a função de uniformizar a interpretação do direito.
- Supremo Tribunal Federal (STF): O STF é a mais alta instância do Poder Judiciário no Brasil e é responsável por decisões que interpretam a Constituição. Muitas decisões do STF têm impacto direto no Direito Administrativo, pois interpretam as normas constitucionais que regulam a Administração Pública e seus princípios. Por exemplo, o STF tem decidido em diversas ocasiões sobre a constitucionalidade de determinadas práticas administrativas, como o controle da licitação e o uso de recursos públicos.
- Superior Tribunal de Justiça (STJ): O STJ tem uma função importante no direito administrativo, principalmente quando se trata de normas infraconstitucionais, como as que regem o regime jurídico dos servidores públicos ou a disciplina de licitações e contratos administrativos. As decisões do STJ ajudam a consolidar a aplicação dessas leis em nível nacional e a dar uma interpretação uniforme a normas que podem ser aplicadas em diferentes contextos administrativos.
Um exemplo de jurisprudência relevante no contexto administrativo é a interpretação das condições de licitação. Em alguns casos, os tribunais superiores decidiram que, mesmo que a legislação permita a dispensa de licitação em determinadas situações, ela deve ser interpretada restritivamente, para evitar abusos no uso do poder público.
Decisões do STF ou do STJ sobre esse tipo de tema têm um grande peso, pois podem modificar a forma como a Administração Pública atua.
A jurisprudência também estabelece precedentes vinculantes, que são decisões que devem ser seguidas pelos órgãos do Poder Judiciário. Isso garante maior estabilidade e uniformidade na interpretação das normas administrativas e evita a criação de insegurança jurídica.
Conclusão: A Relevância do Direito Administrativo na Proteção do Interesse Público
O Direito Administrativo é um dos pilares fundamentais para o funcionamento do Estado e da Administração Pública. Sua importância é ainda mais ressaltada quando aliado ao Direito Constitucional, pois ambos garantem que a atuação do Estado seja sempre voltada para o interesse público, respeitando os princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência.
O profissional especializado em Direito Administrativo tem um papel crucial na orientação da Administração Pública e das empresas privadas que interagem com o Estado, garantindo que todas as ações estejam de acordo com a legislação vigente e com os valores constitucionais.